Histon, Cambridge, 10 AGO 2015
Gravamos a nossa voz numa cinta magnética e podemos reproduzi-la as vezes que quisermos, mas é evidente que de modo algum nos ocorreria dizer que o reprodutor fala. Aliás, dá-se um fenómeno curioso, que é a dificuldade de identificarmos a voz gravada com a nossa verdadeira voz. De modo um tanto similar, quando ouvimos na rádio alguém a falar, sabemos perfeitamente do que se trata: não é o receptor que tem o dom da fala – ele é apenas um meio –, quem fala é o indivíduo que está no estúdio; a autonomia do aparelho não vai além dos seus circuitos eléctricos.
Também podíamos pensar do cérebro e admitir que a mente cerebral não existe por si, é um meio através do qual se reproduz, nos limites que lhe são próprios, aquilo que chamamos de mental.
É por demais evidente que sem cérebro não comunicaríamos, não raciocinávamos, não recordaríamos, ou, pelo menos, não o faríamos de forma organizada e voluntária, do modo superior que sabemos. Haveria, certamente, reflexos mecânicos originados pelas células, mas nada mais do que isso.
Sem a torre de controlo, os automatismos somáticos seriam muito limitados e a nossa humanidade não tinha como se reflectir no mundo.
A nossa vida seria muito baça.
Abdul Cadre