O jovem professor coleccionava títulos académicos como especulador de bolsa acções da banca. Merecia, sem dúvida, estudava bastante e era muito inteligente. Era dos poucos em toda a Índia que dominava à-vontade e por inteiro as mais ousadas hipóteses das altas ciências.
Os seus alunos deliciavam-se a ouvi-lo dissertar sobre Física Quântica, Relatividade, Buracos Negros e outros hermetismos que tais; nisto especulava muito, que na bolsa não.
Um dia, empreendeu uma viagem num vetusto navio de cabotagem, com a finalidade de ir dar uma palestra numa cidade próxima. Instalou-se num pequeno camarote, notando que da parte dos marinheiros a reverência era enorme. Ele não ouvia, mas os marinheiros murmuravam entre si:
– É muito jovem, mas é um verdadeiro sábio…
Um velho marinheiro, de longas barbas e pele curtida por ventos e marés, deslocava-se bem mais do que o necessário ao camarote do jovem professor, zelando pelo seu bem-estar. Demorava-se ali quanto podia para lhe beber as belas e sábias palavras, e dizia para consigo: «que erudição, santo Deus».
Certa noite, pergunta o Professor ao velho marinheiro:
– Ancião, já alguma vez estudaste Geografia?
– Não, senhor. De que se trata?
– É ciência que estuda a Terra na sua forma, acidentes físicos, clima, produção, populações, divisões políticas, etc.
– Não, meu senhor, eu mal sei juntar as letras…
– Ancião, fica sabendo que por isso desperdiçaste um quarto da tua vida.
Noutra noite, depois de uma longa prosa, o professor pergunta:
– Ancião, por acaso estudaste Oceanografia?
– Oceanografia? O que é isso, meu senhor?
– É a ciência descritiva do oceano, dos seres que o povoam e dos seus produtos; tu que ganhas a vida no mar devias saber. Assim, sempre te digo que desperdiçaste outro quarto da tua vida.
O velho marinheiro cofiava a barba branca e farta e murmurava:
– Pois é, senhor professor, foi assim que desperdicei metade da minha vida. Não estudei não senhor.
Na noite seguinte, depois de mais uma longa conversa de sentido único, diz o professor:
– Sabes Ancião, se este barco fosse uma partícula atómica, nunca saberíamos em que lugar se encontrava, qualquer lugar que lhe atribuíssemos era apenas uma probabilidade de entre infinitas outras. E mais: podia estar em dois portos diferentes ao mesmo tempo. E por falar em tempo: se este barco fosse um submarino, o tempo corria para nós mais depressa à superfície do que no fundo do mar. Nunca estudaste Relatividade, Física Quântica, Princípio da Incerteza.
– Não, meu Senhor, eu sou um analfabeto. Eu nem sequer frequentei a escola, aprendi a juntar as letras com o meu pai…
– Ancião, lamento, mas desperdiçaste outro quarto da tua vida.
Triste, acabrunhado, o velho marinheiro saiu dali amargas reflexões. Se aquele professor tão sábio, tão erudito dizia que ele tinha desperdiçado três quartos da vida é porque era verdade. É uma grande tristeza não sabermos todos estas coisas tão elevadas.
Passados uns dias, já a poucas milhas do destino, levanta-se uma terrível tempestade e o barco começa a meter água. O velho marinheiro corre para o camarote do jovem erudito gritando:
– Senhor Professor, Senhor Professor, por acaso aprendeu na natatorialogia?
– Que diacho é isso, Ancião?
– É a ciência de aprender a nadar. O barco bateu numa rocha, está a afundar-se, quem souber nadar alcança facilmente a praia, mas quem não souber vai afogar-se. Se não sabe nadar, lamento, mas acaba de desperdiçar cem por cento da sua vida.
ABDUL CADREInspirado numa história oriental inserida no livro The Art of Living, de William Hart