quinta-feira, março 09, 2017

FALAR DE AMOR SEM RECURSO AO MANUAL

 

Falarmos de amor nem sempre se entende na dimensão que lhe queremos dar. A nossa sociedade hedonista pensa o amor em termos estritamente físicos e mundanos. Por virtude disto (ou defeito) ouve-se amiúde a estafada frase «fazer amor», como se o amor fosse uma espécie de artesanato. O que quem usa a frase quer dizer na sua é copular, ter relações sexuais, etc., e bem andam os jovens quando lhe chamam curtir. Mas isto não é amor? Não, não é, é curtir. Alimenta-se da energia global que chamamos amor, mas não é amor, é uma componente biológica deste, estreitamente ligada ao instinto de sobrevivência, ao repúdio da morte. Cabe na dicotomia Eros e Tanatos, não mais do que isso. Se não, qual a componente de amor relacional no sexo comprado? Qual o amor – se o ódio (sua inversão) o não assiste – da prostituta com o seu cliente?

Mas impõe-se que se diga que, no amor pessoal entre um homem e uma mulher, a sexualidade, para além da sua função reprodutora, tem um papel extremamente relevante na sintonia emocional e no equilíbrio fisiológico, mediante o princípio do prazer. Toda a energia gasta no acto é energia que se recupera em termos de saúde e saciedade, o que reforça o amor conjugal, por mais que se queira ver aí apego apenas. Sê-lo-á certamente se a condição de dádiva for prejudicada pela de posse.

Perguntar-se-á então o que se passa na homossexualidade. Do meu ponto de vista, o acto sexual entre pessoas do mesmo sexo estará inevitavelmente diminuído das principais componentes que tornam a sexualidade necessária e apaziguadora, por muito que possa ser gratificante.

A intimidade física, emocional e intelectual entre dois seres que mutuamente se atraem, envolvendo sexo u não, prendem-se com o que o amor impessoal tem de mais englobante e unificador da humanidade, que é o sentido libertador dos limites do eu. Uma expansão do eu, digamos assim. Aqui é preciso fazer notar que usamos o conceito «eu» como o usa a filosofia, a psicologia e o senso comum. Nada daquelas confusões ocultistas e dos navegantes nas fumaças New Age. O eu é o eu, a faculdade de dizer tu. Cresce quando somos capazes de dizer eu sou tu. Cresce ainda mais quando somos capazes de sentir sermos um com toda a humanidade, um com todos os seres, com todas as coisas.

Falamos de expansão da consciência.